DE MANÉ À MANÉZINHO
Ilha de Santa Catarina e
lado do continente
Santa
Catarina – Brasil
Vamos saber
um pouco do ser mané
Em
tempos não muito distantes, gente da cidade, apelidavam alguns moradores do interior da Ilha de Santa
Catarina de mané. A cidade à que me refiro é Florianópolis, assim também,
chamada por todos que moravam no lado continental.
Suposições
apontam aos nomes Manuel ou Manoel, muitos comuns em todas as regiões
litorâneas, especialmente nos povoamentos do interior da Ilha de Santa Catarina.
Seu
Manoel, seu Manuel,, seu maneca, seu manel, seu mané, pode ter sido o caseiro
de um sítio ou de casa de veraneio de propriedade de alguém da cidade. Seu
mané, sempre tratava essa gente da cidade de doutori, ou seja, pela formação
profissional ou poder aquisitivo.
O
mané pode ser caracterizado como um
sujeito simplório, contador de causos, um matuto de trabalhos pesados, da lida
com os bois e da roça. Uns dos trabalhos de engenho, outros da pescaria e
outros de qualquer serviço braçal.
Mas,
os autênticos manés, eram os malandros exibidos de vida boa, que usavam uma
perna da calça arregaçada até a metade da perna, um pouco abaixo do joelho e
que por distração, se exibiam com uma gaiola na palma da mão, dentro um curió,
um sabiá, uma tia chica ou um coleirinha a dobrar.
Aquele
ou aquela, que come um loc loc com peixe frito frio,
ou ainda, aqueles que comen pirão de água escaldado com carne seca de varal,
assada numa grelha na brasa de fogão de lenha.
Por
várias gerações, abandonados a própria sorte pela gente da cidade e longe da
escola, criaram seus meios de subsistência e modos de falar próprios e
engraçados, que os identificam como o mané ou a mané interiorana da Ilha, assim
como também, nos povoamentos do litoral do lado continental.
Frases
e palavras como, mofas com a pomba na balaia, farinha pouca, meu pirão
primeiro, coberta d’alma, chichilaria, roubar e fugir com a rapariga para mais
tarde casar, e mais...oioió ..oioió.oioió...oioió.oioió.oioió, tas tolo tas,
rebojo, és bom pro fogo, intizica, te toco a mão nos cornos, cambulhão, boi
ralado, eu atiço a bocica em cima de ti, istepô, digerinha, lanço de peixe,
tarrafa a vau, garapivu, mata fome, és bom pumbife, cara de areia mijada, dar
de mamar à enxada, se qués qués, se não qués diz, pomboca, tolo e muitas
outras.
Glossário
Atiçar - incitar
Bocica – cachorra, cadela
Boi ralado – carne moída
Cambulhão
– porção de peixes enfiados pela guelra em cipó à serem vendidos.
Cara
de areia mijada – furos no rosto de quem
teve varíola
Chichilaria – burocracia, lenga
lenga, enrolação com os papéis
Coberta d’alma – roups de quem
morre
Dar de mamar à enxada – preguiçoso
na lavoura com o cabo da enxada debaixo
do braçoDês bom pumbife – Digerinha –
diarréia
És bom pro fogo - expressão usada para dizer que uma pessoa não presta (também ameaça
debochada, de mandar alguém à fogueira.
És
bom pumbife – referindo-se a carne do boi da farra
És um porta milá –perdido, andar
sem rumo ou importa-me lá contigo
Intizica – provoca
Istepô
– expressão de xingar alguém, seu coisa ruim
Lanço de peixe – cercar o cardume
com rede, arrastar, puchar para a praia ou embarcação pesqueira. Locais de
peixes de tarrafa a vau.
Loc
loc – pirão de café, mexido na própria caneca de tomar café.
Mandrião – preguiçoso
Mata fome – prato de barro de se
comer
Mofas com a pomba na balaia – vais
cansar de esperar, não conseguir o que queria, intento
Oioió – interpétra-se como
interjeição de espanto ou admiração
Pomboca
– lamparina pequena com pavio , acesa com querozene, luz de pomboca
Rebojo – vento que sopra de várias
direções, ocorre quase sempre com vento sul
Te toco a mão nos cornos –dar uma bofetada na cara
de alguem que um
Vau
– trechos rasos de águas, ou da beira do mar ou de rio, onde se pode transitar
a pé.
Tolo
– credibilidade frágil, sofrível. Não refere-se a debilidade mental.
Vamos
saber um pouco do ser manézinho
Na
verdade, não se atribui à alguém, como o
criador do pseudônimo manezinho.
Em
inícios dos anos 80 do século passado, nas áreas centrais de Florianópolis como
do lado continental, ouve-se em rodas de amigos, locais de trabalho, bares,
botequins e principalmente no Mercado Público, colegas e amigos serem chamados
de manezinho. Geralmente ou quase sempre, esse colega ou amigo assim chamado,
morava em alguma comunidade do interior da ilha de Santa Catarina.
A
partir de então, o pseudônimo, que pode ter derivado do seu Manoel, seu Manuel,
seu maneca, seu manel, seu mané, começa a difundir-se na boca do povo com o
apelido de manezinho.
Até
a primeira metade da década dos anos 80, ser chamado de manezinho, tinha
sentido pejorativo. No entanto, por muitos havia aceitação, dentro de um clima
amigável e na base da gozação.
Nessa
época, já era destaque em programas de radio como radialista, o saudoso Aldírio
Simões.
Aldírio
constituía-se num personagem carismático, identificado com nossa cultura de base açoriana. Seu ponto de encontro
diário, era o Mercado Público de Florianópolis, além de viver os cantos e
recantos da Ilha e do continente, conhecer sua gente, seus usos e costumes.
Nascido
na localidade de Rio do Braz em Canasvieiras, Aldírio, destacou-se como
radialista, repórter, jornalista, escritor e apresentador de TV. Na TV, criou e
apresentou o famoso programa BAR FALA MANÉ.
Em
meados da década dos anos 80 como radialista, idealiza uma forma de homenagear,
enaltecer o mané manezinho, que tomou proporções de linguajar popular entre
nós.
Todos
aqueles ou aquelas, que se identificam com a maneira simples de viver os nossos
usos, costumes, ajuda mútua e solidariedade dos nativos interioranos da Ilha e
do continente, ou ainda, todos aqueles ou aquelas, que para cá vieram e se
adaptaram a viver essa identidade de simpatia, esse estado de ser e que,
destacam-se perante a comunidade.
Em
1987, elenca os nomes dos manezinhos a serem homenageados e organiza a primeira
edição do Troféu Manezinho da Ilha.
Tinha
no amigo manezinho e saudoso Francisco Amante, o popular Chico Amante, os
préstimos e suporte da organização burocrática dos eventos. Aliás em matéria de
organização, Aldírio era muito bom, mas na improvização.
Testemunhos
relatam que nas primeiras edições do Troféu, alguns manés elencados por
Aldírio, se mostravam reticentes com a homenagem, dado ao sentido pejorativo de
outrora do pseudônimo manezinho.
O
prestígio de Aldírio nos meios de comunicação, enaltecem a honraria do Troféu,
mudam o conceito e o entendimento de ser manezinho.
Nos
anos subseqüentes aos dias de hoje é um
prestígio ser escolhido para receber a honraria do Troféu Manezinho da Ilha.
Num
bom sentido, diz o manezinho, Engenheiro Paulo Ricardo Caminha; o Aldírio
atirou no que viu e matou o que não viu, referindo-se ao auge de sua projeção
com o Troféu Manezinho da Ilha.
Embora
sendo o autor intelectual do Troféu e dos agraciados anualmente, o nosso Mané Mor, cercava-se de uma Confraria
que oferecia palpites para os novos a serem escolhidos. Entre outros dessa Confraria,
fazia parte o saudoso Chico Amante, o ex-Secretário de Segurança Maurício
Amorim o Engenheiro Paulo Ricardo Caminha, o Poeta Luiz Gonzaga Galvão e o
bancário Ire Silva.
Após
a morte de Aldírio em 2006, incorporou-se a Confraria, seu filho Sione Márcio Simões, que organizam
a tradição anual do Troféu Manezinho da Ilha.
Guga,
o manézinho
A
internacionalização do ser manezinho, foi conhecida e difundida, diante da
mídea mundial pelo maior tenista brasileiro de todos os tempos.
Gustavo
Kürten, o nosso Guga, que no topo do ranking da ATP, chamou para si o título de
Manezinho da Ilha. O mundo ficou conhecendo um manezinho impar, que levou sua
simplicidade com competência de grande campeão às quadras de tênis do mundo.
Contos
que conto
Quem conta
um conto, aumenta um ponto . º
-dito popular-
Texto:
Gilberto J. Machado
Historiador